Na noite de quarta-feira, 26 de julho, a renomada autora Glória Perez participou do evento “Metrópoles Talks – Uma História de Novela”, que ocorreu na Casa de Cultura Laura Alvim, no Rio de Janeiro. Durante sua fala, ela expressou seu orgulho ao ver suas obras se tornarem parte da memória afetiva das pessoas e destacou a importância de inspirar novos autores.
A abertura do evento contou com a presença de Danielle Barros, secretária de Cultura e Economia Criativa do estado do Rio de Janeiro. Em seu discurso, ela ressaltou o papel crucial da teledramaturgia tanto na cultura quanto na economia local, mencionando que essa indústria gera empregos e movimenta a economia criativa do estado. Danielle também destacou o impacto do audiovisual no turismo e o investimento significativo de mais de R$ 1,5 bilhão em fomento à cultura nos últimos anos.
Com mais de quatro décadas de carreira, Glória Perez é uma das autoras que mais abordaram temas sociais em suas novelas. Ela explicou que o processo criativo pode iniciar-se de uma imagem, um personagem ou um tema, mas apenas ganha vida quando ela se mergulha totalmente na história. A autora revelou que gosta de escrever em pé, dedicando mais de sete horas por dia ao trabalho, num ambiente organizado e sem um roteiro rígido definido.
Glória compartilhou que durante a escrita, ela visualiza a novela em movimento, o que a ajuda a criar um enredo dinâmico e repleto de surpresas. Um exemplo disso foi durante a elaboração de “Caminho das Índias”, quando ela planejou duas formas de amor — o sereno e tradicional, e o explosivo. Ao contrário do que esperava, o público se apaixonou pelo amor mais calmo, levando-a a reescrever partes da história.
Ela também comentou sobre sua escolha de temas sociais. Para Glória, os assuntos que decidi explorar geralmente são aqueles que a inquietam e que podem estar presentes na sociedade, mas não são notados. Ao desenvolver a personagem Ivana, em “A Força do Querer”, ela se baseou em entrevistas com famílias, psicólogos e pessoas trans, buscando transmitir empatia e entendimento.
A autora relembrou algumas de suas tramas pioneiras, como o drama da falta de infraestrutura em “Partido Alto” e o impacto da AIDS em “Carmem”, onde abordou a doença em um contexto de preconceito. Mais recente, em “Travessia”, ela trouxe à tona questões relacionadas a tecnologias como o deepfake e os novos dilemas sociais que surgem com elas.
Por outro lado, Glória confessou que um dos temas que nunca conseguiu levar adiante foi o aborto, pois considera a questão muito urgente. Ela mencionou que muitos feminicídios têm relação com a pressão que mulheres sofrem para interromper uma gravidez, e acredita que uma novela abordando esse tema teria grande potencial.
A autora também se debruçou sobre a autocensura na arte contemporânea, afirmando que o medo do cancelamento mudou o ambiente artístico. Segundo ela, exigir que a arte seja “politicamente correta” impede a representação fiel da vida e das complexidades da humanidade. Glória acreditava que essa censura atual é até mais perigosa do que a vivida durante a ditadura, pois se instala na mente dos criadores.
Sobre o futuro das novelas, Glória observou que precisam se adaptar a um público cada vez mais imediatista, que consome conteúdo principalmente em dispositivos móveis. Ela sugeriu que as novelas devem ter temas de grande impacto e narrativas mais ágeis para se manterem relevantes, afirmando que “a novela brasileira já foi a melhor do mundo e pode voltar a ser”.
O “Metrópoles Talks” é um projeto que promove palestras e encontros com diversas personalidades, com o objetivo de compartilhar conhecimento e experiências. Recentemente, o evento também contou com a presença do antropólogo Michel Alcoforado e da ex-jogadora de basquete Hortência Marcari, que compartilharam suas histórias e visões com o público.