domingo, 14 de dezembro de 2025
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Abate de jumentos gera polêmica entre cultura e negócios no Sertão

EM 14 DE DEZEMBRO DE 2025, ÀS 07:12

Jumentos do Sertão: Entre a Cultura e o Abate

A imagem do jumento é central na cultura do Sertão nordestino, refletindo tanto a identidade local quanto estereótipos muitas vezes negativos vistos em regiões mais ao sul do país. Apesar de ser considerado um “herói do sertão” em músicas e literatura, o jumento enfrenta uma situação complexa que envolve sua utilização para o abate industrial.

Nos últimos anos, o jumento deixou de ser apenas uma figura do passado agrícola para se tornar parte de um mercado voltado para a exportação, especialmente para a Ásia. A prática do abate começou há cerca de dez anos e, embora ainda seja pequena comparada a outras carnes, como a de frango ou bovina, gerou um intenso debate sobre os impactos para a espécie e a cultura local.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registrou 376,8 mil jumentos no último censo agropecuário, realizado em 2017, uma queda significativa em relação a 1980, quando eram cerca de 1,2 milhão. Estimativas mais recentes apontam que o número de jumentos está em torno de 78 mil, uma redução de 94% desde 1997. No entanto, não existem dados atualizados e confiáveis sobre a população atual desses animais no país, o que alimenta a controvérsia.

Por um lado, organizações de bem-estar animal denunciam que o abate pode levar à extinção da espécie, enquanto o frigorífico Nordeste Pecuária, com sede na Bahia, argumenta que a diminuição populacional ocorreu antes do início do abate industrial. O frigorífico é o maior do setor e é administrado por Alex Bastos, que acredita que a queda no número de jumentos é resultado de mudanças socioeconômicas, como a mecanização da agricultura.

A Nordeste Pecuária começou a operar após um interesse de investidores chineses, que buscam a pele do jumento para a produção de ejiao, uma gelatina utilizada na medicina tradicional chinesa. Bastos afirma que, apesar de alcançar cifras consideráveis, esta exportação representa uma parte pequena do total das exportações do país. Na opinião dele, as ações para proteger a espécie são, na verdade, um obstáculo ao desenvolvimento da atividade e à geração de empregos.

O debate também ganha contornos judiciais. Desde 2018, o abate de jumentos na Bahia é alvo de decisões que vão e voltam, com ONGs e grupos acadêmicos tentando barrar a prática sob a alegação de risco de extinção. Em uma recente decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), o abate foi novamente autorizado, destacando a importância econômica da atividade, especialmente nas relações comerciais com a China. No entanto, ONGs como a Donkey Sanctuary contestam essa relevância e pedem a suspensão do abate até que novos dados sobre a população de jumentos sejam obtidos.

Alex Bastos, por sua vez, menciona a dificuldade de operar em um ambiente de instabilidade jurídica, ressarcindo-se através de pareceres legais que o apoiam. Ele espera expandir suas atividades investindo em fazendas para criar jumentos de forma sustentável, sem depender da captura de animais errantes, uma prática controversa.

As autoridades da Bahia e representantes do frigorífico asseguram que existe fiscalização rigorosa, mas a falta de dados precisos continua a ser um ponto de discórdia. Enquanto isso, a expectativa do futuro dos jumentos no Sertão nordestino permanece incerta. O clima de incerteza aguarda a evolução desta complexa batalha entre a produção, a proteção animal e a preservação de uma parte importante da identidade cultural da região.

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